“O maior truque já realizado pelo diabo foi convencer o mundo de que ele não existe”. Frase com origens no trabalho de Baudelaire (1821-1867), reflete uma perspetiva filosófica sobre a subtileza do mal e como ele pode operar de maneira impercetível.
É curioso como quando escrutino a ação política, tanto nacional como local, esta frase ecoa no meu pensamento. Assim como o Diabo supostamente se esconde por meio da negação da sua existência, muita da ação política atual parece adotar táticas similares para ocultar as suas verdadeiras intenções ou ações prejudiciais.
Vejamos: (1) Negação e Desinformação. É cada vez mais comum ver políticos negarem evidências de corrupção ou má conduta, dar o dito pelo não dito, criando uma cortina de fumo que dificulta a perceção da verdade pelo público, onde a ausência aparente do mal se torna a forma mais eficaz de operação. Aliás, a negação advém muitas vezes na própria crença na mentira que é contada. (2) Normalização do Inaceitável. Gradualmente, comportamentos antes considerados escandalosos são normalizados, tornando-se parte do cenário político quotidiano. Sejam eles acompanhados por um Pêra-Manca ou com um belo churrasco. No processo subtil deste “novo” normal ecoa a ideia de um mal que se infiltra sem ser notado. (3) Manipulação da Narrativa. Assim como o Diabo supostamente convence o mundo da sua não existência, políticos hábeis moldam narrativas que os retratam como benevolentes, mesmo quando suas ações sugerem o contrário.
Esta subtileza do engano advém da aparência de virtude, da distração e desvio de atenções e duma erosão gradual de valores. Assistimos a uma nova ordem da classe política que age como defensora do bem comum, enquanto silenciosamente são promovidas agendas que beneficiam apenas interesses particulares. Táticas de distração são empregues para desviar a atenção de questões críticas e promove-se a degradação dos princípios éticos de forma tão gradual que muitas vezes passa despercebida.
Reconhecer estas estratégias é o primeiro passo para construir uma sociedade mais consciente e resistente aos enganos, garantindo que o “mal”, seja ele metafórico ou real, não possa operar livremente sob o manto da invisibilidade. Assim, deveremos manter sempre um olhar crítico e inquisitivo sobre as ações e discursos políticos, valorizando a transparência e a prestação de contas e promovendo a educação política e o pensamento crítico pelos eleitores.
“No creo en brujas, pero que las hay, las hay”
Publicado na última edição em papel. Outras opiniões: Gualter Sarmento, Adelina Piloto, João Paulo Meneses, Abel Maia e Fátima Augusto.
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