A edição em papel do seu jornal Terras do Ave contém uma entrevista a Carlos Pontes, que foi o presidente do Rancho do Monte durante mais de meio século e que, subitamente, decidiu não concorrer a um novo mandato.
Ontem tivemos oportunidade publicar um primeiro segmento (acesso no final a da página) e hoje fazemos um segundo, mais numa vertente pessoal incluindo a de empresário.
Além do Rancho do Monte, na sua vida esteve ligado a outras instituições locais?
Estive muito tempo ligado ao Círculo Católico de Operários e inclusive nos tempos do dr. Francisco Mesquita, como presidente do CCO, fizemos o célebre Encontro de Estrelas no Cine Teatro Neiva. Com cantores de Vila do Conde e um conjunto musical que formamos.
Como se chamava essa Banda?
Mi Fá, como nas notas musicais.
Esteve também ligado aos escuteiros da Matriz?
Sim, sou um dos fundadores. Até porque a sede chegou a funcionar nesta casa quando o salão paroquial foi abaixo.
E, tal como acontecera com o seu pai, presidiu também à Ordem Terceira de S. Francisco?
Sim, estive três mandatos que é o máximo que os regulamentos Franciscanos permitem, apesar dos pedidos para me recandidatar.
É muito difícil gerir esse tipo de instituições?
Muito difícil, muito difícil mesmo. Ou se tem uma boa equipa, com bons trabalhadores ou qualquer IPSS [Instituição Particular de Solidariedade Social] é muito complicada de gerir. A comparticipação do Estado não é muita e depois se se recebe um donativo lá vem a fiscalização da Segurança Social saber isto e aquilo. É complicado.
Não se voltaria a meter numa IPSS?
Não.
Ainda há pouco tempo surgiram notícias precisamente da Ordem Terceira de São Francisco de que as coisas não andarão bem do ponto de vista financeiro…
Quem está lá também tem de aguentar o barco, mas sei que é difícil. Era preciso criar uma fonte de rendimento, algo que também não consegui fazer. O que não pode continuar é um utente custar mais de mil euros, por exemplo, e a instituição receber só 300 do Estado ou da reforma. Porque depois, é uma bola de neve que vai por ali abaixo. Há em Portugal muitos lares atrapalhados.
O dirigismo para si acabou?
Tenho um sonho: ver reativada a Banda de Música de Vila do Conde. Que era centenária. O meu avô foi lá regente e não gosto que Vila do Conde seja o único concelho do país que não tem uma banda de música. A última atuação da nossa banda foi na procissão da Senhora da Guia, em 2012, e faz falta.
O que faz falta para essa reativação?
Hoje o nascimento, ou renascimento no caso, de uma banda custa muito dinheiro. Por causa do fardamento, do instrumental… talvez mais de meio milhão de euros. Precisava-se aqui de um empurrão gigante.
Da Câmara Municipal?
Da Câmara e talvez de outras instituições. Temos o apoio das Confederações das Bandas e de muitos regentes, mas precisávamos, por exemplo, de apoio jurídico para formar uma associação que aproveitasse o nome, mas que começasse de raiz. Até porque nas Finanças a Banda acabou. Tinha de começar por nós.
Está a falar no plural…
Há um grupo de cinco pessoas da área da música que, de vez em quando, se reúne para falar sobre isto. Chamamos-lhe o “Grupo da Palheta” e temos tudo pensado, mas precisávamos de uma ajuda forte. Sozinhos não conseguimos arrancar.
O que era preciso?
De um espaço para começarmos a trabalhar. É preciso reunir com escolas de música e conferir o instrumental existente e em que estado está. Também tínhamos de ver quantos músicos estavam disponíveis e tratar do fardamento que é igualmente uma parte importante numa banda. Em tempos, cheguei a ter uma promessa de oferta do fardamento, mas não sei se essa disposição continua. É todo um trabalho que só se justificará se houver interesse de Vila do Conde. E atenção: a banda era uma mais-valia para a cidade, não para mim, que estou bem como estou.
Em quanto tempo teríamos a banda de volta?
Acho que num ano, ano e meio, conseguíamos ter em Vila do Conde uma banda média com 30, 40 elementos. Isto para começar. Uma boa banda deve ter 60 a 70.
É esse o seu atual projeto?
Para já é só um sonho, como disse, mas não estou no resto do mundo, sou do resto do mundo. Não gosto nem vou ficar parado.
Profissionalmente é sócio-gerente da Casa Pontes que inclui serviços funerários, algo que durante muitos anos foi olhado de soslaio. Hoje ainda é assim?
Não, hoje a vida de um agente de funerário é muito mais fácil. E a sua atividade empresarial respeitada e entendida. Ao contrário do que acontecia no passado, já há senhoras a fazer os funerais e é tudo muito mais personalizado. As agências tratam de tudo. Do vestir à maquilhagem – temos inclusive um funcionário que recebeu formação especifica – passando pelas exigências de documentação, os diálogos com os padres, agendamentos de igrejas e de cemitérios ou de crematórios…enfim, um serviço completo que é proporcionado.
A Casa Pontes continua a ser um negócio familiar?
Sim. Tem o meu tio, a minha esposa, a minha mãe e três funcionários que são quase como família.
O seu filho é que, para já, não.
Está a acabar o curso de gestão e depois logo se verá. Primeiro tem de fazer os estudos.
Tirando os dos seus familiares, qual foi o funeral que mais lhe custou fazer?
O de um vizinho, que morava em frente. Era meu amigo desde a infância. Morreu de forma trágica por um comboio e toda a situação foi complicada.
E o maior funeral a que assistiu?
Acho que foi o do padre Porfírio Alves. O do José Régio também foi um que marcou Vila do Conde.
A Casa Pontes também organiza procissões, qual é a que dá mais trabalho?
A do Nosso Senhor dos Navegantes, nas Caxinas. São vários andores e grandes. Estamos lá durante mais de duas semanas a montar andores. E o número de figurantes também é significativo. Agora rondam os 300, mas já foram quase 500.
Já está a ser pensada a do próximo agosto?
Para já estou a pensar mais na do São João. É mais pequena, mas é uma belíssima procissão.
Também faz a de Nossa Senhora da Guia…
E a de Nossa Senhora das Neves, em Azurara, por exemplo, ou as lindíssimas do Senhor Morto e a dos Passos, que têm uma estética diferente, uma simbologia distinta.
E têm sido solicitados fazer mais procissões?
Sim, mas nem sempre podemos aceitar porque preferimos só avançar se tivermos a disponibilidade para um serviço de qualidade. Antigamente, não se falava em Agência Funerárias, mas sim em armadores, porque além dos funerais todos faziam também as procissões. Hoje muitas das agências só estão interessadas na parte dos funerárias. Nós enquanto pudermos, vamos manter a nossa tradição.
Resumindo: o negócio vai correndo…
Vai. Vai correndo bem.
Pode ver outra parte da entrevista aqui
Encontra a entrevista na íntegra na edição em papel do seu jornal Terras do Ave que está nas bancas (veja aqui a 1.ª página)

