Confesso que já não suporto.

O espaço televisivo está cheio de políticos, comentadores e putativos políticos-comentadores que não sabem dizer outra coisa senão que a Europa não se tornou competitiva o suficiente e está condenada à desgraça. São os novos arautos da obviedade. As suas “profundíssimas” reflexões sobre o status quo europeu já só estão ao nível da sua capacidade intelectual: simplória, imediatista, básica, redundante, fútil.. Dizem que a Europa não tem defesa, que a Europa não tem indústria, que a Europa não tem inovação, que a Europa só sabe regular. E lá trazem o seu icónico argumento non sequitur e falsamente dicotómico e de espantalho (e de jardim de infância) da regulação das palhinhas de plástico…

Mas aonde andavam e aonde andam esses mesmos profetas-visionários quando desfrutávamos e ainda desfrutamos da vida num continente que tem dos maiores índices de qualidade de vida, com as mais liberais e garantísticas das democracias e um nível de protecção social sem precedentes e comparação no mundo? Ou será que o que querem dizer (entrando nas dicotomias) é que não se importam em trocar os valores liberais, humanistas e democráticos e a nossa economia social de mercado pela construção de uma “super União Europeia” (ou de uns “Estados Unidos da Europa”…) industrial, inovadora e pujante, ainda que com um “governo” plenipotenciário, separado por “parlamentos” e “tribunais” de fantoche e gerindo o interesse público e o aparelho do Estado como quem gere uma Fortune 500, qual “Grande Irmão” orwelliano, qual quê!?

É que, como dizem os americanos, a quem muito comparam com a Europa, não há almoços grátis. O bem-estar, a estabilidade e a qualidade de vida que o nosso velhinho continente atingiu não caíram do céu. Tudo tem e terá o seu preço. E o desafio político é preparar a Europa, militar, tecnológica e economicamente para os novos (des)equilíbrios mundiais, sem prejuízo das nossas democracias liberais, da segurança jurídica e, na medida do possível, da qualidade de vida e da protecção social de que todos beneficiamos.

Talvez se estes novos Jeremias oferecessem soluções tanto quanto subitamente se preocuparam com o futuro da Europa e tanto quanto se prontificaram a propalar estas obviedades, talvez a Europa estivesse mais bem posicionada para enfrentar as emergentes potências autoritárias… Nós, europeus, não precisamos de mais profetizações, precisamos de soluções!

Este artigo está na última edição em papel do seu jornal Terras do Ave (veja 1.ª página aqui).

Outros autores de opinião: Abel Maia, Gualter Sarmento, João Paulo Meneses, Adelina Piloto e Fátima Augusto  

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