Com formação em jornalismo, Nelson Ferreira da Silva passou pela comunicação social local antes de lhe aparecer a possibilidade de trabalhar para instituições da União Europeia. E é da Bélgica que vai procurando seguir o que se passa na sua Vila do Conde e mais ainda da freguesia da Junqueira onde tem familiares diretos.

Nesta entrevista que se insere na rubrica “Itinerâncias” e que encontra na íntegra na edição em papel do seu jornal Terras do Ave, o vilacondense conta-nos como tem sido a sua vida além-fronteiras e o que tem programado para o futuro próximo.

Local e data de nascimento: Vila do Conde, 26 de outubro de 1981

Escolas que frequentou: Escola primária Lamelas n.o 2, na Junqueira; Escola EB 2+3 Frei João, em Vila do Conde; Escola Secundária Eça de Queiroz, na Póvoa de Varzim; Escola Superior de Jornalismo, no Porto.

Locais onde trabalhou: Portugal, Irlanda, Inglaterra e Bélgica

Estado Civil: Casado, duas filhas

 

Sinteticamente, como é que foi a sua vida até sair do país?

Vivi em Portugal até final de 2008. Depois de terminar a licenciatura em jornalismo, em 2003, trabalhei em vários órgãos de comunicação social de Vila do Conde e da Póvoa de Varzim. Depois, em 2007, fui para Lisboa, e após um estágio no Gabinete do Parlamento Europeu, recebi uma proposta para ir trabalhar para a Representação da Comissão Europeia em Dublin. Foi nessa altura que emigrei.

 

Quando e porque é que decidiu emigrar? E passou por outros países?

Nunca pensei em “emigrar por emigrar”. Naquela altura, aquilo que mais me interessava era poder trabalhar numa instituição europeia. Era esse mundo que me atraía. Sabia que, apesar da existência dos gabinetes da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu em Lisboa, dificilmente arranjaria colocação cá. O meu plano inicial passava por ficar três anos em Dublin. No entanto, um ano e meio depois surgiu uma oportunidade para ir para Bruxelas. Se excetuarmos uma passagem por Londres nos meses que antecederam o referendo do Brexit, é pela capital belga que tenho estado desde 2010.

 

Como descreve, sinteticamente, o país onde está?

A Bélgica é um país simpático para se viver (apesar do clima – por vezes, passam-se semanas sem se ver uma nesga de azul no céu). Tem belíssimas cidades, bem preservadas, e vastas regiões planas que contrastam com as zonas montanhosas das Ardenas. Os belgas têm uma relação muito saudável com a natureza e os animais, cuidam verdadeiramente dos seus parques e dos seus jardins. Além disso, e não menos importante, apesar das muitas diferenças (administrativas, linguísticas, culturais), o país tem um eficaz sistema de saúde e de educação.

 

E comparando com Portugal?

Não é muito fácil estabelecer comparações com o nosso país (descontando o facto de partilharmos mais ou menos o número de habitantes). Desde logo porque a Bélgica está dividida entre os que falam francês, flamengo (um dialeto do neerlandês falado na Flandres) e alemão (em menor escala). Para além disso, cada região aplica as suas próprias regras em áreas como a economia, o transporte, o ambiente e o emprego. E até na educação: por exemplo, os períodos de férias escolares variam de região para região. É um país com uma costa minúscula (em comparação) e não é incomum encontrar um falante de flamengo que rejeite falar francês e vice-versa. Porém, e por mais estranho que possa parecer, as coisas parecem funcionar muito bem.

 

O que faz profissionalmente nesta altura e onde?

Sou tradutor no Secretariado-Geral do Conselho da União Europeia.

 

O seu futuro próximo passa por continuar no estrangeiro?

É arriscado prever o futuro, mas não imagino uma mudança nos próximos 15 anos. Há muitos fatores a considerar e, entre eles, o mais importante de todos: a situação familiar.

 

O jornalismo é algo trancado no passado?

O jornalismo foi uma paixão que não resultou. E ainda bem – o jornalismo ficou certamente a ganhar! Continuo a gostar de escrever notícias, e mantenho intacta aquela vontade de “por em comum”, mas o mundo das redações não é, definitivamente, para mim.

 

Pondera regressar a Portugal? Quando?

O regresso a Portugal tem estado sempre no meu horizonte desde que fui para a Irlanda. Mas, como disse acima, nos próximos 15 anos será difícil e, para ser sincero, nem sequer penso muito nisso nesta altura. Se os astros se alinharem na perfeição, ainda planeio viver um ou dois anos noutro país antes de voltar definitivamente. Mas, para já, não.

 

Ainda que à distância segue o que se passa em Vila do Conde?

Tento estar o mais atualizado possível, até porque fui aí jornalista e há assuntos que continuam a interessar-me. Para além de viajar para Portugal durante o ano, e do contacto regular com familiares e amigos, costumo ler a informação institucional, os jornais locais e acompanhar o que vai surgindo nas redes sociais.

 

O que é que lhe agrada mais em Vila do Conde?

O respeito pela História – passada e presente – e pelas tradições. Também me deixa bastante feliz saber que esta é uma cidade de escritores, de artistas plásticos, de músicos, de jornalistas, e de eventos culturais.

 

E o que lhe desagrada?                                                                                

Tendo crescido a oito quilómetros do centro de Vila do Conde, nunca gostei da divisão “cidade vs resto do concelho”, e que “assimetrias” só seja tema de quatro em quatro anos. Muito se fez nas últimas duas décadas, é inegável. Mas é preciso continuar a aproximar as duas realidades. Também não aprecio a ideia – errada – de que Vila do Conde é menos conhecida e/ou menos cosmopolita em comparação com cidades vizinhas.

 

Qual é o recanto de que mais gosta em Vila do Conde?

Entrar na cidade vindo de Azurara, vergar perante a imponência do Mosteiro, antes de subir ao monte para ver o rio a correr para o mar. Sem isso, parte do encanto de Vila do Conde esfumar-se-ia.

 

Como é que descreve Vila do Conde às pessoas do país onde se encontra?

Uma cidade histórica, com uma belíssima costa, com praias de areia fina, onde se come bem. Terra de pescadores. É um sítio agradável para passear com crianças. Não haverá muitas cidades costeiras que possam rivalizar com a beleza da Princesa (rima, mas é verdade).

 

A primeira coisa que faz quando regressa a Vila do Conde é…?

Depois de visitar a família na Junqueira, olhar a foz a partir do Mosteiro, provar a pastelaria conventual (se a balança o permitir…), e passear na marginal. Não me parece mal para início de conversa.

 

Globalmente, o que significa Vila do Conde para si?

Por mais paradoxal que possa parecer, sinto-me hoje muito mais ligado a Vila do Conde do que quando aí vivia. Sempre que regresso, aquilo que procuro é o porto seguro das coisas que não mudaram (por oposição às coisas que inevitavelmente foram mudando com o tempo!). A sensação de “primeira casa” não muda. Estas ruas e avenidas são as “minhas” ruas, as minhas avenidas. Este mar e este rio são “meus”. Por mais anos que viva na Bélgica, ou noutro lugar qualquer, é aqui que pertenço.

Esta é uma entrevista que encontra na íntegra na edição em papel do seu jornal Terras do Ave.

 

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