O entrevistado na rubrica “O que é feito de si?” , do jornal Terras do Ave, foi o economista Joaquim Pereira Cardoso, que em dois momentos distintos ocupou o cargo de presidente da Junta de Freguesia de Mindelo .
A entrevista está na íntegra na edição em papel que encontra ainda nas bancas.
Ontem teve oportunidade de ler uma primeira parte (acesso no final desta página) e hoje damos a conhecer um trecho com uma componente política mais vincada
Foi presidente da junta, eleito pelo PS, por duas vezes entre 1989 e 1997 e entre 2001 e 2008. Como surgiu essa possibilidade?
Nunca pensei em ser candidato a uma junta de freguesia. Vivia no Porto e estava absolutamente fora do meu radar, mas o engenheiro Mário Almeida argumentou que eu era a única pessoa capaz de ganhar as eleições porque fugia ao estereótipo de um presidente de junta e acabou por convencer-me, garantindo-me também que me apoiaria para poder fazer coisas uma vez que há anos que em Mindelo não se fazia nada.
Mas no final do mandato essa argumentação já não podia ser utilizada…
E passado um ano dos quatro de mandato, constitui uma comissão para ser encontrado alguém que fosse candidato nas eleições seguintes, mas em boa verdade, no final tive de voltar a concorrer. E fui reeleito. Mas disse: acabou, não vou mais. Nem no último lugar da lista. Admito que foi um erro político. Se calhar, se não o tivesse feito, se tivesse entrado na lista, talvez o PSD não tivesse ganho.
E como regressa em 2001?
Com alguma pressão. Tenho alguma dificuldade em dizer não. E na minha opinião a Dra. Maria José Ramos [presidente eleita pelo PSD], que era minha vizinha, teve um mandato de quatro anos em que realizou pouquíssimo.
Se era tão próximo de Mário Almeida porque não se filiou no PS e continuou a ser independente?
Gosto de ser livre, dizer o que me vai na alma. Filiado, teria condicionamento que não aceito.
Mas é um socialista?
Sou um social-democrata. Da social-democracia do Norte da Europa, que está mais perto do PS do que do PSD que é um partido liberal. Sou adepto da livre iniciativa, mas com toda a franqueza, defendo que, em determinados sectores estratégicos, como o da energia, das comunicações, da banca, o Estado deve poder ter alguma influência. Sou adepto de um Estado Social. Com o neoliberalismo os mais vulneráveis ficam para trás. Sou um humanista-progressista, não convivo bem com a ideia: “les uns et les autres”.
E a nível local como vê o PS?
Nos últimos quatro anos o PS não existiu. Do meu ponto de vista, serviu para alguém o cavalgar, para lhe servir de sustentáculo, de fundamento, de alicerce, para uma candidatura à Câmara Municipal. O PS em Vila do Conde, do meu ponto de vista, foi capturado.
Capturado?
Escrevi aqui mesmo no Terras do Ave, julgo que em agosto de 2019, que Vítor Costa assaltou o poder ou deu “uma golpada” com a recolha de 500 novas inscrições de militantes só para chegar ao poder.
Já conhecia Vítor Costa?
O professor Vítor Costa esteve na candidatura do professor Santos Cruz e a colaborar com o PSD, em 2005…
Contra o eng. Mário Almeida?
Exatamente, mas alguém falou com o eng. Mário Almeida que seria interessante ir buscar o Vítor Costa e… assim foi. E mais tarde, em 2017, tentou entrar na lista da dra. Elisa Ferraz, mas o lugar que pretendia já estava ocupado.
Mas o nome de Vítor Costa não foi também equacionado para a sucessão de Mário Almeida?
Também. Um dia o eng. Mário Almeida disse-me ter uma sondagem em que o PS ganharia, em qualquer circunstância, quaisquer que fossem os candidatos: Elisa Ferraz (melhor resultado), António Caetano (2º) ou Vítor Costa (3º). Sugeri que fosse o António Caetano, dizendo-lhe que se fosse Vítor Costa faria campanha contra o partido.
Porquê?
Porque tinha sabido coisas que não eram compatíveis com a minha ética. O meu candidato seria o Caetano, uma pessoa íntegra e, no sentido profissional, muito competente. Vítor Costa foi um vereador que não se notabilizou, nem deixou qualquer marca positiva.
Nesse encontro ficou com a ideia de que Mário Almeida ia preferir Eliza Ferraz?
Existiam várias razões para se perceber que ele se sentiria mais confortável em escolher Elisa Ferraz. Era uma pessoa que conhecia há muitos anos e com quem tinha uma relação de amizade fora da Câmara e com o marido, o Zé Luís. Eu tenha a opinião de que a doutora Eliza é uma pessoa íntegra, honesta e que esteve na câmara para servir. Mas sinceramente entendia que não tinha competências para ser presidente de câmara. Vereadora, sim, mas um presidente necessita de ter um desígnio, uma visão para o concelho. Conceber, planear, integrar, liderar pessoas e projetos. Precisa de mundividência. A Dra. Elisa, tanto quanto eu conhecia, não tinha parte dessas caraterísticas.
O que acha que vai acontecer a 12 de outubro?
Há quem me diga que o PSD pode ganhar as eleições, que o PS continuará com maioria e também quem fale qu o PS vai ficar sem maioria absoluta. Em termos de “Vox Populi” há de tudo. Mas não sabemos minimamente qual será o comportamento do eleitorado do Chega. Não esqueçamos que foi o segundo partido há quatro meses, atrás do PSD. Logo, se olhássemos para isso e não pensássemos nas pessoas, diria que o PSD vai mesmo ganhar as eleições. Porque há uma vontade de mudança que vai para além do concelho e que tem a sua génese nas duas eleições legislativas anteriores. E depois de quatro anos em que não se fez nada, não acredito que o PS possa ter uma maioria maior. Admito que possa ter uma maioria relativa, o que só acontecerá porque as pessoas, em geral, por egoísmo e comodismo, não querem saber quem está a governar. Por isso digo que a democracia está a esgotar-se como regime.
A gestão de Vítor Costa foi assim tão má?
Admito que as pessoas na hora da verdade vão pensar que uma câmara não é, nem pode ser, uma agência de festas. Não se esqueça que só em julho e agosto, em Vila do Conde ter-se-ão gasto cerca de um milhão de euros em contratos registados no portal Base, fora tudo aquilo que foi dado às associações, às comissões de festas, às paróquias, aos grupos… E há aqui, pelo menos, um elefante branco, diria, no meio disto tudo, que tem a ver com os grandes negócios da câmara com a Santa Casa. Foi terceirizada a função da habitação para a Misericórdia, agora há mais um negócio para 450 fogos, houve também o terreno para o centro de saúde das Caxinas e os 2 milhões e 400 mil euros pagos de indemnização à família do Engenheiro Arlindo Maia a propósito do edifício Apolo, pagos através da homologação de um acordo extrajudicial dado que não pendia sobre a Câmara Municipal qualquer obrigação, já que o tribunal nada tinha decidido. Tudo isto dá que pensar. Até parece que a Santa Casa mudou de objeto social e agora é construtor civil ou promotor imobiliário.
Já foi um autarca do PS, como viu as notícias da ocorrência de divergências entre a liderança de Vítor Costa e alguns dos militantes influentes em freguesias?
Existem pessoas, que há quatro anos foram candidatos a presidente de junta, que estão profundamente desiludidos com a atitude do professor Vítor Costa em nem sequer falar com as pessoas. Por exemplo na minha freguesia, em Mindelo, três pessoas que tinham sido presidentes de junta e um quarto que tinha sido candidato nunca conseguiram que o presidente da Comissão Política lhes respondesse sobre o tema autárquicas 2025. Esta atitude de não enfrentar as situações, de fugir à realidade é demonstrativo do carácter de alguém. Por isso, existe um grupo de militantes e simpatizantes do PS que não apoiará, nem votará Vítor Costa.
Mas vão dar uma indicação de voto?
Seria muito apelativo dizerem votem em A ou em B, mas muitos socialistas não compreenderiam que o fizessem. Aliás as pessoas são crescidas e espero que não vão na “manada”, há quatro anos não conheciam o professor Vítor Costa como Presidente, hoje já perceberam, pelo que não realizou e pelas decisões que tomou, que foi um verdadeiro “flop”.
Pode conferir a 1.ª parte da entrevista aqui

