Nos dias de hoje, olhando para a realidade do nosso concelho (e não só), um autarca pretende demonstrar que deve ser reeleito, porque o seu mérito, enquanto tal, é inquestionável.  Para o efeito, necessita que se percecione um grande empenhamento em estar próximo das pessoas e em ter uma panóplia de projetos em execução (mesmo que fictícia). Não importa o que não fizeram. As pessoas têm memória curta e o que não foi feito já esqueceu. Estas coisas estão estudadas, cientificamente “provadas”, pelo que basta seguir os “mandamentos” da sociologia, da comunicação e do marketing político. Repare-se, por exemplo, nas publicações do FB para perceber que as ideologias deram lugar ao populismo exacerbado (parolo, paroquial e para idiotas). Repare-se, também, nas festas e no “croquete” e na brutal afetação de verbas, subcontratadas por agências de intermediação (aumentando os custos). Repare-se no brutal aumento da dívida municipal, sem que daí advenha qualquer bem-estar para as pessoas e famílias. A delapidação de recursos sem quaisquer impactos na sociedade é intolerável e os resultados intangíveis.

Ora, ser autarca, deveria significar, ser alguém que se empenha, com mais ou menos sabedoria, no bem comum, na defesa de todos, na satisfação das necessidades da população, na proeminência do interesse geral sobre o interesse particular, no serviço à comunidade e nunca no servir-se através das elites “interesseiras” da comunidade. Criticamos Putin ou Trump (duas faces da mesma moeda), assistimos à destruição de Gaza e do seu povo, à estúpida guerra na Ucrânia, ao “desvio” de 5% dos orçamentos para “Defesa” e ignoramos o que se passa à nossa volta (ainda que noutra escala, mas com pontos comuns).

Tudo isto para vos dizer que em Mindelo, entre outras coisas, assistimos no mesmo arruamento (Via 8 de julho) a 3 factos que demonstram em que medida as pessoas se respeitam, as pessoas respeitam a lei e as autoridades se fazem respeitar (atuando para as cumprir)). Este “arruamento florestal”, em plena ROM, de interesse público, cf. Despacho nº 8588/2008, publicado no D.R., teve várias condicionantes para a sua construção, entre outras, “garantir a interdição de construção na área adjacente ao traçado bem como a constituição de um corredor arborizado ao longo do eixo viário com recurso a exemplares de espécies autóctones.” Pois, pese embora desde dezembro de 2024, a Câmara ter sido alertada para uma construção que parecia não respeitar tais condicionantes (agora é visível um muro urbanisticamente vergonhoso e deplorável e um acesso à Via perigoso), nunca houve qualquer resposta ao munícipe, como é comum com o atual executivo, quando alguém se dirige ao município para apresentar um assunto ou saber algo. Informação recente dá-nos conta que o assunto foi participado ao MP, à IGAMAOT, à CCDRN e ao ICNF.

Outro caso, é junto à estação “Espaço Natureza”. Limparam uma bouça, fizeram um “jardim” e, para já, tornaram o espaço numa zona de sestas. Como é evidente o “perigo” espreita. Qualquer dia aparece lá uma casinha muito gira.

Finalmente, há já vários anos, na parte mais a poente da Via, colocaram uma infraestrutura para cavalos, apoderaram-se de centenas de metros quadrados do erário público e lá continuam ((ainda que não licenciados (ao que se diz)).

E se nos respeitássemos? Se nos respeitássemos, cada um faria o que os instrumentos urbanísticos municipais permitem. Não só respeitaríamos as regras e os regulamentos, como respeitaríamos os demais cidadãos, no pressuposto que esses instrumentos são gerais e abstratos, sendo o benefício ou o malefício semelhante para todos.

Temos a tendência para calar ou para dizer que está tudo bem, quando, efetivamente, pouco ou nada está bem. Vivemos no “faz de conta”. Tenho a convicção de que só teremos bons autarcas, quando formos exigentes com eles e deixarmos de acenar com a cabeça.

A Câmara Municipal e a Junta de Freguesia fogem das coisas que possam dar chatices, pelo que se pergunta: para quê eleger alguém que não trata do bem comum e que não coloca o interesse geral acima do interesse particular? Que autarcas são esses que não respeitam, nem fazem cumprir a lei e os regulamentos?

São estas coisas que enfraquecem a democracia, que nos fazem desacreditar nos políticos e é por estas razões que cada vez mais só vemos na política os menos capazes.

O aquecimento global, a demografia e as profundas e aceleradas desigualdades são os grandes desafios que a todos se colocam, particularmente, aos políticos.

Joaquim A. Pereira Cardoso

Economista

Antigo Presidente da JF de Mindelo (eleito em 4 mandatos, independente, em listas do PS)

Nota: Este artigo está na última edição em papel do seu jornal Terras do Ave (veja o que traz aqui). 

Outros autores de opinião: João Paulo Meneses, Abel Maia, Gualter Sarmento, Pedro Pereira da Silva e Fátima Augusto

 

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