Foi apresentado recentemente, numa sessão pública em Mosteiró, o livro intitulado “A Feira da Lameira – Espaço de Comércio, Memórias e Afetos (1896- 2025), da autoria de Adelino Piloto, historiadora natural de Vila do Conde, que numa breve entrevista (encontra na íntegra na edição em papel), por escrito, adianta aspetos desta sua obra e do trabalho que desenvolve. E sobre este último aspeto lança uma crítica à Câmara Municipal.
Como surgiu a oportunidade de escrever este livro?
As feiras são a alma de um lugar, por meio delas se conhece o rosto do povo, os seus gostos, os seus saberes ancestrais, os seus sabores e a sua labuta pela sobrevivência. As feiras são marcas identitárias, retratam a comunidade, e abracei este projeto a convite do Presidente da União de Freguesias, Sr. Amândio Couteiro, com grande entusiasmo e amor, porque a Feira da Lameira é para mim muito mais do que um local de comércio, ela é um lugar de memórias e de afetos. Sou natural da vizinha freguesia de Guilhabreu e fui durante muito tempo sua assídua frequentadora, daí que tenha sido particularmente gratificante versar sobre esta temática. E aproveito desde já para enaltecer a sensibilidade do Sr. Amândio Couteiro para a apoiar a cultura na sua mais ampla e diversificada aceção, desde a popular à dita erudita. Fê-lo durante os seus mandatos como Presidente da Junta de Freguesia de Mosteiró, recordo que sou coautora da monografia sobre Mosteiró editada no ano 2000, o que significa que há um quarto de século que desenvolvemos um profícua parceria em prol do progresso da história e da cultura no município de Vila do Conde. E está a fazê-lo agora como líder da União de Freguesias, exemplo meritório que deveria ser seguido pelos demais autarcas.
Para quem ainda não teve oportunidade de ler esta obra, como a descreve?
A temática das feiras pela sua ancestralidade e importância económica, social e cultural, tem sido objeto de diversos estudos, contudo, a Feira da Lameira tinha merecido até à atualidade apenas referências muito escassas e sucintas, assim, o principal objetivo foi a reconstituição histórica da vivência de 129 anos, registando para a posteridade o que de mais importante e peculiar tem acontecido no decurso do tempo relativo ao mesmo evento, que desde 1896 enche o histórico largo da Lameira com cores, aromas e sabores, que se misturam com os pregões dos vendedores e com a animação e alegria da clientela.
Podemos concluir que o livro é importante não só para a freguesia de Mosteiró, mas também para compreender alguns dos movimentos sociais, económicos e culturais do município de Vila do Conde?
Sim, porque subsidiariamente e em relação intrínseca com o principal objeto de estudo, indica-se as caraterísticas singulares do Largo da Lameira, bem como as potencialidades que o tornam o mais emblemático da freguesia de Mosteiró. E como temáticas complementares, faz-se uma incursão pela origem e evolução das feiras em Portugal, e regista-se de forma circunstanciada as feiras e mercados que tem existido e/ou existem no município de Vila do Conde.
No decurso do processo historiográfico o que mais a surpreendeu?
As obras de requalificação e de modernização de que tem beneficiado a feira, assim como o largo que lhe serve de cenário há 129 anos, obras, que se devem em grande parte ao dinamismo e espírito de liderança de Amândio Couteiro; os momentos festivos de comemoração do aniversário da Feira da Lameira; e os testemunhos dos feirantes (vendedores e compradores), que permitiram aceder a uma história mais humanizada e expressiva. Na atualidade, a Feira da Lameira conta na sua dinâmica com 42 vendedores e assiste-se ao facto curioso de grupos familiares de comerciantes, tendo alguns dos atuais vendedores aprendido as técnicas de venda com os avós, pais ou tios, e já estão a transmitir a experiência e a titularidade do negócio aos seus parentes, o que significa continuidade. O que mais me surpreende é a extraordinária capacidade de resiliência que tem demonstrado a Feira da Lameira, tem tido o condão de se adaptar aos novos estilos de vida e de consumo e isso é um prenúncio de futuro auspicioso
Tem outras obras na forja?
Na forja está a obra “Os Presidentes de Junta do Município de Vila do Conde (1974-2024)”, que aguarda há quase um ano que a Câmara Municipal honre o contrato que assinou. Trata-se de um projeto que desenvolvi desde 2022 e que pressupôs desbravar pela primeira vez o arquivo das juntas de Freguesias do concelho, e que contou com a quase unânime colaboração dos Presidentes de Junta do período democrático, dos do passado e dos que estão no exercício de funções. E, é compreensível, que os Presidentes de Junta que apoiaram e trabalharam em prol desta obra se sintam frustrados e apreensivos, e tenho sido contactada por alguns Presidentes de Junta, que estão a equacionar lançar a obra individualmente, ou em grupo, caso a Câmara Municipal não avance rapidamente com a sua edição. Trata-se de uma obra inédita e de inegável valor cultural e político, que projetaria o município de Vila do Conde para a vanguarda da história autárquica em Portugal.

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