Aos 77 anos de idade José Maria Pinho já derrotou um tumor, um problema na coluna e ultrapassou um grave problema cardíaco. É um dos mais conhecidos empresários nascidos em Vila do Conde se bem que grande parte da sua atividade foi exercida noutros concelhos e especialmente na Maia, a terra do seu pai. Foi presidente do Rio Ave quando o clube viveu tempos de glória desportiva e, entre outras façanhas diretivas, construiu o atual estádio.
Fizemos uma viagem pela sua vida encaixando a entrevista (onde foi notória a sua prudência em não ferir suscetibilidades) na nova rubrica do jornal intitulada “O que é feito de si?”.
Hoje publicamos uma 1.ª parte dessa conversa que encontra na íntegra na versão em papel di seu jornal Terras do Ave.
Onde e quando nasceu?
No dia 11 de dezembro de 1947 [77 anos], em Canidelo, Vila do Conde.
Os seus pais eram de Vila do Conde?
A minha mãe era de Vila do Conde, era de Canidelo, e o meu pai, São Pedro de Avioso,Maia.
O que faziam?
Tinham uma mercearia em Canidelo. O meu pai montou depois um café e também trabalhou com móveis. Quando comprei herdei as partes ao meu pai doei aquilo à freguesia, ao rancho da freguesia de Canidelo.
Quantos irmãos teve?
Éramos três filhos e eu o mais novo. O mais velho morreu com 50 anos, com cancro, e o outro, o do meio, morreu em Moçambique, numa mina, na Guerra Colonial, no dia 29 de junho de 1967.
Teve oportunidade de estudar ou foi trabalhar cedo?
Os meus pais queriam que fosse estudar, mas eu não quis. Fiz a 4.ª classe e aos 10 anos fui para a AMBAR [na altura uma empresa de encadernação de livros] do senhor Américo Barbosa que foi um grande homem e de quem gostava. Mas, passados dois anos, disse ao meu pai que estar numa fábrica era uma prisão e fui para a marcenaria e carpintaria de Joaquim Fernandes da Silva, nas Guardeiras [Maia]. Também trabalhei no Algarve. Depois regressei para a mercearia e café dos meus pais e voluntariei-me para a tropa. Fui mobilizado para a companhia 2343 para Luanda, a 4 de dezembro de 1967, mas troquei com um indivíduo que nunca mais vi. Paguei, estive em Lisboa mais 3 meses e vim para o Porto onde estive de 1 de março de 68 até agosto de 70, no Quartel-General. E como tinha ano e meio de tropa e já não ia para a guerra, resolvi casar.
É nessa altura que começa a pensar na sua vida profissional?
Sim. Num terreno da família fiz um armazém de móveis e eletrodomésticos e tive a representação da AEG Telefunken [empresa alemã fabricante de rádios televisores e componentes]. Ao fim de um ano já era considerado um dos melhores agentes da AEG a vender.
Qual era o segredo?
Vendia barato. Optava por não ganhar dinheiro com os eletrodomésticos, mas atraía clientela para outros produtos para compensar como os móveis, tapeçarias e etc. Vendia para todo o lado e quando a televisão começou a aparecer tive a fábrica de antenas que me permitiu fazer muitos negócios. Por exemplo, quando a TV surgiu nos Açores, eu apareci lá e ganhei muito dinheiro. Cada vez que ia aos Açores, ganhava para dois ou três apartamentos.
E na construção?
Nunca construímos, mas mandávamos construir. Comprávamos terrenos, loteamos, fazíamos os projetos e depois adjudicávamos a empreiteiros. Fiz muita coisa na Maia, cerca de mil apartamentos, mais de 200 mil metros quadrados em armazéns e, mais tarde, em Vila do Conde o “Outlet” [Nassica] com um grupo de espanhóis. Teria tido outro [empreendimento] também, em Mindelo junto ao mar, mas está parado desde 1983 e 1984.
Onde?
São cerca de 300 mil metros quadrados da praia de Mindelo à de Árvore. Que lhe chamaram de Reserva Ornitológica. Está lá parado.
É uma área enorme.
Um quilómetro de frente ao mar e 280 metros daí para trás.
Mas chegou a estar aprovado?
A Câmara deu-me viabilidade para fazer lá à volta de mil apartamentos e julgo que dois hotéis, mas tínhamos de fazer uma ligação da Estrada Nacional 13, em Mindelo, até ao mar. Na altura não havia Comissão de Coordenação e metemos os projetos que custaram mais de oito contos. Só que, depois apareceu uma foto minha ao lado do Mário Almeida [ex-presidente da Câmara de Vila do Conde e socialista] na campanha presidencial de 1986, porque muitos dos presidentes de clubes estavam na candidatura de apoio a Mário Soares e, no tempo do Cavaco [então Primeiro-Ministro após a vitória da AD (PSD/CDS PPM)] o projeto foi chumbado. Chumbado politicamente.
Toda aquela área ainda é sua?
Minha e dos herdeiros do Arnaldo Sanfins, que morreu há pouco tempo. Um dia ver-se-á o que pode acontecer. Senão fica como está, mais 50 anos. Para os meus filhos. netos ou bisnetos.
Quantos filhos é que tem?
Três. A mais velha, a Leninha, é advogada e formou-se em Direito e Música. O segundo, o Pedro, formou-se em Economia e o mais novo, o Nuno, em Engenharia.
E já tem netos?
Cinco. Dois filhos da Leninha, dois filhos do Pedro e um do Nuno.
Chegou a ter muitas sociedades empresariais?
Sim. Cá em Portugal e também no Brasil e nos Estados Unidos. Mas estou progressivamente a fechá-las.
Os seus filhos não querem?
Não, querem sobretudo fazer a vida à sua maneira.
Mas durante ainda vai às suas firmas?
Sim, de vez em quando.
Como é que é um seu dia, digamos, normal?
Se apagar a luz às 11 horas da noite ou à meia-noite, às duas de manhã estou acordado. Pego no telefone e vou ler as notícias porque os jornais vão saindo com as suas novas edições. Mais tarde sou capaz de dormitar mais duas horitas e de manhã vejo o que passou na noite anterior e assim por diante.
É uma pessoa interessada também pelo que se passa em Vila do Conde?
Quero que tudo corra bem, mas não ando atrás das coisas. Os presidentes das câmaras, lá estão e eles é que têm de resolver. E sei que eles são como os presidentes do futebol, querem fazer o melhor possível para as suas terras. Curiosamente, eu até por acaso não voto em Vila do Conde.
Esta foi a 1.ª parte de uma entrevista que encontra na íntegra na edição em papel do seu jornal Terras do Ave. Publicaremos a 2.ª parte em breve.
Eis a 1.ª página do número atual (ver aqui)

