A corrupção, termo que carrega em sua raiz latina (corruptiōnem) a ideia de rutura e decomposição, transcende o significado linguístico para se tornar um espelho das fraturas éticas nas sociedades. Se na Antiguidade o conceito remetia à degradação física, hoje materializa-se em atos que corroem a confiança nas instituições. No campo político vive-se um paradoxo: enquanto se exigem padrões éticos elevados, vêm-se frequentemente escândalos que redefinem os limites da tolerância social.

A evolução semântica do termo – de “putrefação biológica” a “suborno” – revela como a corrupção se adapta aos contextos históricos. Na Roma Antiga, já se combatiam os “corruptores” que desviavam recursos públicos, antecipando debates modernos sobre o uso privado de bens coletivos.

Não se tratando de um caso de corrupção típico, o episódio envolvendo Miguel Arruda, parlamentar do Chega acusado de furtar bagagens no aeroporto de Lisboa, funciona como sismógrafo de um mal-estar mais amplo. Enquanto o partido tenta circunscrever o caso à esfera criminal, e diversos setores da sociedade ridicularizam o facto, os mais atentos percebem nele a materialização de uma cultura de apropriação indevida – ainda que em escala ínfima. A justificativa de que “há crimes mais graves” revela a hierarquização perversa que normaliza pequenas corrupções, alimentando o ciclo de degradação moral e institucional.

Na esfera autárquica, a proximidade entre eleitos e eleitores, que deveria fortalecer a transparência, por vezes torna-se terreno fértil para favoritismos e clientelismos, transformando câmaras municipais em feudos modernos onde o interesse público se confunde com agendas pessoais. Quase metade das denúncias de corrupção em Portugal são de autarquias, o que destaca a necessidade de vigilância cívica.

Cada mala furtada, cada favorecimento mínimo, compõem o mosaico de uma cultura política que naturaliza a violação de limites. O país volta às urnas em 2025. Será que aprendemos alguma coisa?

Este artigo integra a última edição em papel do seu jornal Terras do Ave (veja os assuntos da 1.ª página aqui).

Outros autores: João Paulo Meneses, Romeu Cunha Reis, Miguel Torres, Rafael Terroso, João Paulo Meneses e Carlos Real.

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