Setembro de 2024.

Marcam-se 27 anos da revisão constitucional de 1997.

Perguntará o meu estimado inaudito leitor por que motivo, num casual dia de Setembro, há que recordar a revisão constitucional de 97?

A resposta é simples. Foi ela a responsável pela admissão das candidaturas de movimentos de cidadãos independentes aos órgãos das autarquias locais, aguerridamente defendido, à época, pelo Partido Socialista. O que, aqui, em Vila do Conde, assume uma especial relevância. Sobretudo quando 27 anos depois, o Presidente do PS de Vila do Conde, o Professor Doutor Vítor Costa, veio a público, numa entrevista à Onda Viva de fevereiro deste ano, dizer de sua justiça sobre os movimentos independentes que, pelos vistos, “não são independentes”…

Ora, é irresistível imaginar o Professor Doutor Vítor Costa transportado 27 anos atrás para os debates da Assembleia da República, contra os próprios deputados do PS, empenhadíssimos na consagração constitucional dos direitos eleitorais dos movimentos independentes.

Imagine-se o cenário.

Tem a palavra o deputado do PS, Jorge Lacão:

– “Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os partidos, sempre o dissemos, são essenciais na democracia portuguesa, mas, a nosso ver, nada justifica que tenham o privilégio de organizar a iniciativa política que, na sua raiz, é e corresponde a um direito de cidadania a exercer pelo povo soberano sem outras limitações quanto ao intermediário”.

Pede a palavra o deputado Vítor Costa, também do PS:

– “Sr. Presidente, Srs. Deputados do PS: Os movimentos independentes não são independentes! São dissidentes! As lideranças destes movimentos são de pessoas que procuram ter poder pelo poder pessoal. São, portanto, movimentos unipessoais. Não têm princípios, valores, barreiras, não tem que prestar contas a ninguém”.
(apupos das bancadas do PS)

O Orador:

-“Oh Srs. deputados do PS, estes movimentos independentes não têm qualquer democracia interna, não têm rigorosamente nada! Nós, que estamos integrados nos partidos, nós não fazemos escolhas… Nós fazemos propostas! Todos os nossos candidatos são pessoas que são propostas, não escolhidas. Isto é que é ser independente! Os movimentos independentes, por não irem a votos internamente, levam a que os seus candidatos não tenham limites, barreiras, princípios… Que optem pelo insulto e que por este discurso, também fazem parte dos fenómenos populistas e extremistas que assolam a democracia!”

Devaneios à parte, registo o seguinte: que os movimentos independentes são movimentos unipessoais, geralmente assentes na verborreia messiânica, característicos de um país que só vê rostos e não vê ideias, nisso estou de acordo. Agora, “elevar” os movimentos independentes a responsáveis pela degradação da democracia, qualificando-os de “extremistas” e dando a entender que não passam de um bando de ditadores “sem democracia interna”… Como dizem os ingleses, “hold your horses”.

Publicado no jornal a 18 de setembro. Outras opiniões: Romeu Cunha Reis, Miguel Torres, João Paulo Meneses e Sara Padre

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