Opinião de Elizabeth Real de Oliveira

Mais de quatro em cada dez euros gastos pelos empregadores, com os salários, não chegam ao bolso dos trabalhadores portugueses (isto é, quase metade do salário), sendo absorvidos pelo Estado. Entre os países da OCDE, Portugal, está entre aqueles onde o chamado hiato fiscal (em inglês tax wedge) no trabalho é mais acentuado, isto é, onde o peso do IRS e dos descontos feitos pelo trabalhador e pelo empregador, para a Segurança Social, é maior no total dos custos laborais. Um trabalhador que em 2023, tivesse um salário bruto de 1000€, solteiro e sem dependentes, o valor do imposto descontado mensalmente seria de 205€ (IRS mais Segurança Social), recebendo em casa 795€. Por outro lado, o empregador, para poder remunerar um salário de 1000€ ao seu colaborador, tem que gastar 1.237,50€, isto é, entrega ao estado, como imposto, 237,50€. O que é que isto significa? O estado arrecada em impostos 442,50€ ou seja 44% do valor de referência do salário bruto de 1000€.

Mas para além dos números, o que é que isto significa mesmo? Infelizmente, significa que os jovens portugueses recém-licenciados, para ambicionarem ganharem mais, têm que imigrar para países onde a política salarial é mais competitiva; significa que os empregadores têm muita dificuldade em decidir sobre o aumento de salários, pois coloca em causa a sua sustentabilidade financeira, no longo prazo; significa que entre o salário mínimo e o salário médio, pouca diferença existe, esmagando as expetativas de crescimento profissional e de carreira, tanto para colaboradores como para os empregadores. Olhando para esta realidade percebe-se que falhamos na construção de um país melhor para as novas gerações.

A única forma de quebrar este ciclo “viciado” é devolver o desejo aos portugueses de empreender, criar e investir, e, dar aos jovens a esperança de uma vida melhor. O modelo de crescimento económico deve passar pela valorização, promoção e celebração do talento, criação de oportunidades, aumento da produtividade e competitividade.

Nota: Os valores aqui apresentados foram calculados tendo por base um simulador de salário líquido do Doutor Finanças referente ao ano de 2023.

Publicado no jornal a 21 de fevereiro. Outras opiniões: Miguel Torres, João Paulo Meneses, Carolina Vilano, R. Cunha Reis e Pedro Pereira da Silva.  Na atual edição em papel: Abel Maia, Gualter Sarmento, Adelina Piloto, João Paulo Meneses e Sara Padre.

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